6 de janeiro de 2015

Âncora.

Dizem que encontro das águas
quer dizer embate
Mas seria necessário algo tão perdulário?

O encontro se dá
à quem quer se banhar
Águas do rio com águas do mar.

No limiar da força e da tranquilidade
Não há que se apegar na tempestade
Mas em meio ao refúgio das almas ancoradas.


Por Aslien.

 

Despejo da Alma


Estava se sentindo um lixo, seu interior estava tão vazio que dava pra escutar os roncos vindos de dentro. Enquanto caminhava em direção ao bar mais perto, pra encontrar alguns poucos conhecidos, pela estrada esburacada e barrenta percebia que o mundo girava em um ritmo estranho, o ar ventava estranho, o peso de seu caminhar estava estranho...

Chegou à porta do bar, mas não entrou de imediato, parou alguns segundos para fumar um cigarro enquanto tentava decifrar aquele clima atípico, buscando nos rostos que passavam uma explicação... Opa, rosto conhecido! Seu amigo de anos atrás que havia chegado de uma longa viagem. Cumprimentaram-se. Alguns cabelos brancos deixara o rosto dele mais maduro.

Entraram juntos no estabelecimento. Tocava rock, uma bandinha dessas desconhecidas. Pediram dois copos de chope pra começar, logo as cadeiras em volta da mesa foram sendo ocupados por conhecidos e desconhecidos.

Tudo passava como se fosse câmera lenta, seus olhos enxergavam as pessoas ali, mas sua cabeça se perdia... (Ela estava ao seu lado, mas parecia desconfortável, minutos depois ela beijava outro, dizia que o amava, dizia que o odiava...).

Uma colega de seus amigos se aproximou, era simpática, não teve como conter um sorriso nos dois cantos da boca, os dois se olharam nos olhos. Mas não passava de um dia estranho, os significados se perdiam em cada gole que dava em seu copo de vidro, que há anos era utensílio daquele lugar, provável que já tivesse tomado naquele mesmo copo umas 3 ou 5 vezes, mas claro que não poderia descobrir isso...

Naquele momento a banda parou de tocar, e que se ouvia a gritaria de um sábado a noite de bêbados alegres. Era hora de sair daquele transe, levantou-se e deu sua parte. Três amigos fizeram o mesmo. Fez questão de acompanhar todos em suas casas, não tinha presa, e caminhar debaixo da escuridão não fazia diferença. Enquanto caminhava sozinho, passou de novo em frente ao bar.

Típico bar velho, porém lotado constantemente, devia ser o letreiro o sucesso daquele lugar "Confusión" piscando... Saía de lá a menina simpática, rosto bonito, olhos estreitos e vibrantes. Cumprimentara-se novamente, ela lhe fez a pergunta. "Por que parece tão triste?" e ofereceu o isqueiro.

Era um convite para que fossem juntos caminhando, desengasgando aquilo que os estrangulava. De repente, ela não era mais a menina simpática era uma menina que trazia dores nos olhos, tinha dentro de si angústias, porém demonstrava força. Em meio a fumaça dos cigarros os dois se sentaram na calçada, a rua estava em silêncio, talvez apreensiva com o fato de duas pessoas estranhas estarem sentadas por ali sem dizerem absolutamente nada. Por alguns minutos o silêncio lhes pareceu íntimo e acolhedor e as mãos responderam a esse momento. Juntas permaneceram por um tempo indeterminado.

Por Aslien.

O Quarto

O senhor com sua barba desgrenhada resmungava, debaixo da coberta [concha]:

"Oras, que colcha mais quente! Que calor do inferno!"

"O senhor poderia comprar um ventilador...”. 
Disse a enfermeira, enquanto dobrava alguns lençóis e os colocava no armário. Seu rosto era irônico e belo e, era a grande e única visita daquele senhor fazia dois anos:
 “Ventilador? Não vê que estou impossibilitado de sair daqui! E ainda terei de caminhar até a venda!"

Disse entre várias tossidas...

A enfermeira sorriu em meio às dobras dos lençóis, revirando os olhos. O senhor não fazia a barba fazia um mês alegando impossibilidade de fazer grandes esforços:


"Está bem, vou deixá-lo por alguns minutos, tudo bem?"


Deitado ali estava relaxado, estava relativamente confortável. Podia quase tudo.

Olhou para o lado, a janela brilhando sob a luz do sol, sim, o sol sorria. Olhou pro outro, um quadro colorido, um campo que se perdia no horizonte, lindo!

Olhou sua colcha, cor azul fraquinho, sem graça, triste de agonia. Ele então se levantou, procurou nas gavetas um maço e caminhou até a janela enquanto tentava, sem sucesso, acender o cigarro:


 “Maldito isqueiro!"

Por Aslien.